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Em nome do Pai

Paternidade na ótica do utilizador.

Em nome do Pai

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Pedagogia televisiva para adultos

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Não gostando, particularmente, de desporto nem sendo um ferveroso adepto de futebol. existe, todavia, uma actividade estereotipadamente masculina de que não prescindo- o zapping. 

Numa destas noites em que o comando andou num virote, naquela actividade fabulosa que é estar a olhar para o écran da televisão sem estar verdadeiramente a ver nada, parei num dos episódios da segunda série "Shark Tank Portugal". Espectador e assumido fã da série original, onde os  investidores são verdadeiros "sharks" e apesar de haver um vilão (para quem assiste, toda a gente sabe de que falo de Kevin O'Leary) gosto particularmente das competências que denoto nos investidores: capacidade de escuta activa, competências ao nível da comunicação positiva, capacidade de formular questões sem formular juízos de valor nem assumir um estilo agressivo e, sobretudo, empatia. 

O que assisti, boquiaberto, na edição portuguesa foi um chorrilho de reacções mal educadas, arrogantes e prepotentes a vários projectos, muitos deles, provenientes de jovens que arriscam e se expõem num programa de televisão defendendo uma ideia que consideram válida e na qual investiram o seu tempo, dinheiro e energia. Não que seja acérrimo defensor  de que o "empreendedorismo é que é" e que "basta acreditar e tudo se consegue!" e todo aquele conjunto de empreendo-clichés, muitas vezes desfasados da realidade, muitas vezes apenas assentes em sonhos que não têm potencial de concretização, algumas vezes delírios dos seus criadores sem aferirem as necessidades dos mercados e dos seus público-alvo. Tudo isto acontece, no dia-a-dia, e acredito plenamente que estes investidores ouvem, diariamente, ideias "peregrinas" por dá cá aquela palha e que os níveis de tolerância a alguns delírios seja baixo. Acredito.

Mas também acredito que quem não tem capacidade de se colocar no lugar do outro, capacidade  de recuar e se lembrar que já esteve em estádios anteriores, em situações análogas, com sonhos impossíveis ou difíceis de concretizar, quem não se lembra da forma mais simpática com que ouviu um "não", não pode ser uma pessoa de sucesso. Pode ser um profissional bem sucedido, com EBITDAs elevados, prémios de carreira, iates e aviões comprados, viagens ao espaço realizadas e tudo o resto mas não será, com toda a certeza, uma pessoa gentil, humana e empática. E são essas as características pessoais, na minha perspectiva, que fazem de um ser humano um ser digno desse nome.

 

Também não pensem que tenho embirração com o mundo do empreendedorismo, que se enganam. Já afirmei, ali atrás, que gosto imenso do conceito do programa original, das ideias inusitadas que aparecem, da coragem e audácia de algumas pessoas em arriscar e investir as suas energias em projectos pouco óbvios, da capacidade de anteciparem e diagnosticarem necessidades aos consumidores, de darem resposta aos seus problemas do dia-a-dia.  Acontece na edição do "Shark tank" português como acontece na do "Masterchef Portugal" c

om um prestigiado cozinheiro português que desempenha um papel (só posso acreditar que se trata de representação) agressivo e crítico, desagradável e petulante. E se há, em cada um dos programas da edição portuguesa, um jurado que se destaca pela postura arrogante e prepotente, lamento que os outros jurados assumam uma conivência passiva, rindo-se da falta de maneiras, divertindo-se com a falta de empatia, assistindo a uma sucessão de atitudes que evidenciam uma espécie de bullying televisivo, tão portuguesinho e nacional, tão poucochinho e lamentável. 

E, sim, lamento que não consiga assistir, impávido e sereno, às edições do Shark Tank português nem do Masterchef Portugal. Assumo já que sou fiel espectador do Shark Tank norte-americano e do Masterchef Australia, onde se assistem a fracassos e experiências mal sucedidas, sempre com feedbacks reais e sem paninhos quentes, mas nunca sem uma dose de empatia. Nunca.

 Não sei o que falha aqui, se uma tentativa de apimentar episódios com sobranceria gratuita, de aumentar audiências com atitudes da maior arrogância, se criar empatia com os concorrentes de um e de outro programa. A mim causa-me lamento.

E fico com a certeza de que a minha filha não terá qualquer pressão para se tornar numa empreendedora bem sucedida ou numa cozinheira de renome, almejando assim à fama e à popularidade. Não por estas vias. O que mais me importa na educação dela é que nunca se torne numa pessoa desagradável e que retire prazer com a humilhação dos outros, que não precise de se sentir poderosa explorando as fraquezas alheias e que, sobretudo, não sejam opiniões mal educadas e cretinas que estabeleçam a sua fasquia e ditem o seu sucesso. 

Nem que para isso tenha que ir para longe de mim e tornar-se ser empreendedora nos Estados Unidos ou chef de cozinha na Austrália.  Assim seja. 

 

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